Quando um jornalista se especializa na cobertura diária de uma determinada área não é raro ele se deparar com assuntos que rendam infinitos desdobramentos. Contudo, após algumas publicações sobre o tema, facilmente o fio condutor é perdido e se faz necessário uma grande retomada a favor da sequência dos fatos, o que às vezes não cabe em jornais impressos.
Dessa forma, impulsionados pela vontade e a necessidade de se aprofundar no tema e contar grandes histórias, sem correr o risco de os leitores se perderem, a solução encontrada por muitos jornalistas é utilizar o livro como suporte.
Mas como migrar da realidade narrativa e comercial jornalística para a editorial? Durante a mesa Livro de Investigação, que ocorreu na tarde do segundo dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo 2013, os jornalistas Hugo Alconada, do La Nación argentino, Marianela Balbi, diretora do Instituto de Imprensa e Sociedade da Venezuela, e Jacinto Rodríguez Munguía, Revista Emeequis, México. Todos com livros desta categoria publicados, ainda sem tradução para o português, compartilharam um pouco de suas experiências e deram dicas para os jornalistas que se sentem motivados a escrever um livro, mas não sabem como ou não conhecem o processo.
Autor de “Los secretos de la valija” (2009), “Las coimas del gigante alemán” (2011) y “Boudou, Ciccone y la máquina de hacer billetes” (2013), Hugo Alconada dividiu com os presentes a sua receita de bolo. Assumidamente obsessivo e compulsivo por organização, o atual editor investigativo do jornal argentino La Nación, deixou claro que o pensamento chave para se construir este tipo de material é ter em mente que tudo deve ser planejado para simplificar a leitura.
Para ele o caminho é simples. Primeiro, deve-se juntar todo o material num “arquivo mãe”. Entrevistas, documentos, informações complementares, curiosidades. Tudo deve ser posto num documento corrido a fim de centralizar as informações. Feito isto, ter um backup é fundamental. Alconada, por exemplo, costuma criar uma caixa de e-mail só para guardar este primeiro material e recomenda guardar também em um pen-drive.
Em seguida, a organização. Distinguir visualmente a linha principal do caso, que será divida nos capítulos do livro, das informações adicionais é imprescindível. Prólogo, notas de rodapé e as chamadas “ventanas” (textos que vem entre os capítulos para explicar detalhes dos procedimentos utilizados) auxiliam nesta separação. E por último, a divulgação. Para Hugo, ter um agente literário que saiba negociar com as editoras e auxilie na relação com a imprensa é uma das partes mais importantes.“Afinal de contas, não adianta ter um bom material em mãos e não ter como difundi-lo”, ressaltou Jacinto Munguía. Ele lamentou que não teve a sorte de um bom auxílio profissional nesta parte como Alconada.
Autor dos livros “La Otra Guerra Secreta” e “Todos los culpables”, Munguía contou que mesmo com o material pronto em mãos, precisou esperar o momento certo e buscar várias editoras antes de publicar seu primeiro livro. “A conversa é sempre a mesma. Eles elogiam o trabalho, mas não querem publicar por motivos de mercado, por ferir alianças, entres outras coisas. Acabamos tendo que esperar”, explicou.
Além da questão da distribuição, o jornalista mexicano reforçou ainda a necessidade de uma boa pesquisa. “É preciso acreditar em casualidades e no absurdo. Se você tiver paciência e contar com um pouco de sorte, os arquivos históricos podem se tornar a sua principal fonte”, informou, “uma coisa é dizer, outra bem diferente é comprovar com documentos”, alertou Jacinto Rodríguez Munguía, com a propriedade de quem passou mais de cinco anos buscando documentos em arquivos. Durante a busca por informações, por exemplo, Munguía foi surpreendido por mais de três mil cartas que comprovavam a relação de poder entre os meios de comunicação e o Governo Mexicano durante o tempo de censura no país.
Contudo, não se pode esquecer o ingrediente principal: a motivação. Tanto Alconda quanto Munguía acreditam que jornalistas são verdadeiras máquinas de fazer livro. E a razão para isto é a intenção que existe por trás.
No caso da jornalista venezuelana Marianela Balbi, que investigou o caso do desaparecimento da obra “Odalisca com calça vermelha”, de Henri Matisse, do Museu de Arte Contemporânea de Caracas, e publicou o livro “El rapto de la odalisca”, o motivo tinha a ver com o registro e a impunidade do crime. “Os museus da Venezuela se converteram em instituições repletas de problemas administrativos, deficiências e problemas de segurança física, permeadas por ideologias populistas”, explicou ela. Balbi ressaltou ainda: “É de vital importância deixar registrado para gerações futuras e contextualizá-lo”.
Denunciar a fim de que a repercussão do livro suscite em investigações jurídicas para revelar fatos e punir os culpados é o que todos esperam no final. E, para a jornalista venezuelana, este desejo está no caminho de se concretizar.
- Passo a passo, por Hugo Alconoda:
https://www.dropbox.com/s/8h7r1mi3oil6ewa/Libros%20de%20investigaci%C3%B3n.ppt
Texto e foto: Luana Severiano (4° ano / ECO-UFRJ)
Serviço:
Livros de investigação
Com Hugo Alconada (La Nación, Argentina), Marianela Balbi (diretora do IPYS, Venezuela), Jacinto Rodríguez Munguía (Revista Emeequis, México) e mediação de Ewald Scharfenberg (Armando Info)
Domingo, 13 de outubro de 2013 – 16:00