Depois de 35 anos de jornalismo, Eduardo Faustini não se arrepende de nenhuma reportagem que fez. Mesmo que, para seguir com o seu trabalho, seja obrigado a se cercar de seguranças e carros blindados 24 horas por dia.
Tem vida social restrita e, em casos de urgência, sai do país. Insiste em atender todas as ligações do público, mas ao receber algum envelope ou caixa pelo correio, manda para o raio-x da Rede Globo. Suas matérias vão ao ar aos domingos.
Na segunda-feira, Faustini começa a receber as ligações e e-mails anônimos. “Quer me matar? Entra na fila”, costuma responder. Quando ganha vinho no fim do ano, entrega a garrafa ao porteiro. “Olha, se tu morrer, eu saberei que esse vinho está envenenado”, diz brincando.
Faustini não sai em fotos, nem costuma ir a congressos, mas faz questão de assinar cada matéria com o seu nome verdadeiro. “É a única hora em que eu me coloco como cidadão, como jornalista e como profissional”, diz.
O repórter não pode ir além da assinatura. Sua preocupação não é apenas com a segurança, mas em não poder seguir com os seus disfarces. No entanto, como usa seu nome verdadeiro, não escapa de familiares nas festas de fim de ano e feriados. Entre uma cerveja e outra, explica suas reportagens, como consegue esconder uma câmera e como continua vivo.
Faustini diz já ter respondido todas as perguntas dos curiosos. Quando escuta seu nome na academia de ginástica, num restaurante, fica tentado em assumir a identidade, mas aprendeu a se policiar. Vale mais a pena que não o conheçam.
Tudo mudou após a morte do jornalista Tim Lopes, em 2002. Foi quando a liberdade de entrar em favelas e comunidades no Rio teve o seu fim. Hoje, Eduardo Faustini se recusa a conversar com traficantes. Não quer mais entrevistá-los, quer denunciá-los. Para isso, utiliza disfarces e câmeras escondidas. Se precisar virar o papa Francisco, ele será o papa Francisco. “Se tiver que ser um jacaré, na beira de um lago, eu me transformo num jacaré. Terei rabo, pele e boca de jacaré”, diz.
Um dos momentos que mais aprecia durante a reportagem é quando sua equipe entra em contato com os investigados. Faustini adora quando as pessoas negam todas as acusações sem saber que foram filmadas.
Ele não se preocupa com erros, pois só publica quando tem certeza. Se cometer algum erro, não perderá somente o emprego, mas a profissão.
“Se eu errar, deixarei de lado meus prêmios e todas as reportagens que já fiz. Tudo se desmanchará, como água entre os dedos”, conclui. Durante o Congresso Global de Jornalismo Investigativo, realizado dos dias 12 a 15 de outubro na PUC do Rio de Janeiro, apresentou a reportagem “A cara da corrupção”, publicada em março de 2012.
Produzida em parceria com o repórter André Luiz Azevedo, a matéria apontou fraudes na venda de serviços para hospitais públicos do Rio. Os acusados perderam mais de R$800 milhões em contratos fraudulentos. Todos foram presos. Eduardo Faustini não se considera um herói, espera que a justiça seja feita por quem tem direito. “Não faço justiça, faço notícia”, diz.
A maior dificuldade na produção de “A cara da corrupção” foi encontrar um diretor de hospital honesto. No Brasil, cerca de 40% do dinheiro público é desviado, segundo Faustini. E esse número tende a crescer. Por isso, faz questão de mostrar o rosto do investigado. E também, porque se escondesse a identidade, receberia críticas do público e seu trabalho seria colocado sob suspeita.
A televisão se tornou a sua maior arma. Descobriu que políticos e gestores têm muito mais medo da má exposição que de um processo judicial.