A matéria investigativa está a um clique de distância. Mas, para achá-la, é necessário procurar no lugar certo. Marty Steffens da Universidade de Missouri, nos Estados Unidos, e Paul Radu, do projeto Reportagens de Crime Organizado e Corrupção, da Romênia, apresentaram, na Conferência Global de Jornalismo Investigativo, as melhores ferramentas de busca que não estão no Google. Elas são usadas como o pontapé inicial para quase todas as investigações sobre negócios internacionais. Segundo eles, o mais importante é fazer o seu próprio banco de dados.
David Cay Johnston, presidente do IRE. Foto: Rafael Rezende
Investigar crimes financeiros é um dos trabalhos mais complexos do jornalismo. Os palestrantes da mesa “Investigando fraudes financeiras” contaram os bastidores de investigações jornalísticas e destacaram as dificuldades de apurar irregularidades na área econômica, especialmente quando elas envolvem grandes empresas, nesta segunda-feira (14), durante a 8ª Conferência Global de Jornalismo Investigativo. O jornalista David Cay Johnston, presidente do Investigative Reporters and Editors (IRE), deu dicas sobre como investigar crimes financeiros. Ele disse que é fundamental que o jornalista tenha noções de contabilidade.
Depois de 35 anos de jornalismo, Eduardo Faustini não se arrepende de nenhuma reportagem que fez. Mesmo que, para seguir com o seu trabalho, seja obrigado a se cercar de seguranças e carros blindados 24 horas por dia. Tem vida social restrita e, em casos de urgência, sai do país. Insiste em atender todas as ligações do público, mas ao receber algum envelope ou caixa pelo correio, manda para o raio-x da Rede Globo. Suas matérias vão ao ar aos domingos.
Saber trabalhar com bases de dados é um diferencial no currículo de jornalistas. No entanto, é preciso que os dados façam algum sentido através da visualização dessas informações. Durante mais um dia de oficinas da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, alguns participantes tiveram a oportunidade de conhecer algumas ferramentas de visualização de dados que podem ser utilizadas on-line e gratuitamente. Guilherme dos Anjos, gerente de contas sênior do Google no Brasil, apresentou as ferramentas Google Maps Engine, Google Earth e Google Street View e mostrou exemplos de como o jornalismo pode usar mapas para contar histórias. “Uma das melhores experiências com mapas não é apenas olhá-lo, mas poder interagir com os dados e entender os acontecimentos”, afirma.
Matheus Leitão e Rubens Valente, jornalistas da sucursal da Folha de S. Paulo em Brasília, foram responsáveis pela publicação de uma série de reportagens que trouxe à tona arquivos confidenciais da ditadura militar brasileira. Na entrevista a seguir, feita após a mesa “Arquivos ocultos da ditadura” da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, eles explicam o processo de apuração deste trabalho, que ganhou menção honrosa na categoria Jornal do prêmio Vladimir Herzog, e os obstáculos que enfrentaram para ter acesso aos arquivos históricos. Ivana Moreira (Veja – BH), Rubens Valente e Matheus Leitão (Folha de S. Paulo – Brasília)
O jornalista é um mediador. Você citou que é importante transformar assuntos densos em algo mais didático. O que é essencial para um jovem jornalista amadurecer quanto a isso?
Liberdade de expressão e preservação da memória: as principais propostas das biografias históricas estão sendo ameaçadas pela lei. É o que afirmam os escritores Mário Magalhães e Audálio Dantas, que falaram sobre os desafios de escrever uma biografia não autorizada na manhã de hoje (14), no Congresso Global de Jornalismo Investigativo. Para Audálio — autor do livro que conta a história do jornalista Vlado Herzog –, o pagamento de 10% sobre o valor das vendas para biografados ou familiares e empresários é “uma ação contra a liberdade de expressão”. Para escrever As duas guerras de Vlado Herzog, o jornalista foi procurar informações sobre a vida de seu personagem no Arquivo Nacional. “Eu tinha em mãos a autorização da família para ver os documentos, mas me disseram que eu precisava apresentar o atestado de óbito.
O jornalista investigativo precisa da assistência das redes de proteção à liberdade de expressão para tornar a profissão mais segura. Esta foi a principal mensagem passada pelos palestrantes da mesa “Contra-ataque: ferramentas legais e outros recursos contra violações”, realizada domingo (13), na 8ª Conferência Global de Jornalismo Investigativo. Eles destacaram que o suporte de associações de jornalistas, sindicatos e organismos internacionais é uma das formas mais eficientes de fazer valer o direito à informação. Segundo Peter Noorlander, diretor da Media Legal Defence Initiative, ONG do Reino Unido que presta assistência jurídica a jornalistas, os profissionais devem estreitar relações com grupos que defendem a liberdade de expressão. Noorlander enfatizou que o jornalista precisa ser corajoso para enfrentar as ameaças: “o importante é que ele lute, reaja e nunca se cale para fazer valer seus direitos”.
Em vigor no Brasil desde 2012, a Lei de Acesso à Informação ainda tem muito avançar. Segundo Fernando Rodrigues, da Folha de S. Paulo, um exemplo que o Brasil deve ter em mente são os Estados Unidos. “No site da Casa Branca é possível ver os salários de todos que trabalham para o governo, sem maiores obstáculos. Quando você clica para fazer o download, aparecerem diversas opções de arquivo, e cada um escolhe o melhor para o que necessita fazer. Isso sim é a transparência elevada à décima potência”, comenta. Além de Rodrigues, Ivana Moreira (Veja BH) e Marina Atoji (Abraji) participaram da mesa “Mapa de Acesso s Informações Públicas 2013”, na Conferência Global de Jornalismo Investigativo.
Como descobrir quanto o governo federal gasta para alimentar as emas que vivem no Palácio da Alvorada? No início da tarde desta segunda (14), penúltimo dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, que acontece na PUC-Rio até terça (15), o economista Gil Castello Branco ensinou o caminho a ser percorrido para chegar a este e outros dados sobre gastos públicos. O Diretor do Contas Abertas citou exemplos de grandes reportagens que foram capa de jornais e revistas de grande circulação e apresentou um passo-a-passo de como chegar às informações que deram origem a elas. O uso do dinheiro público para pagamento de diárias em hotéis pela ex-ministra da Cultura Ana de Hollanda, os altos repasses do Governo Federal à empresa Delta Participações, os gastos com a Copa do Mundo de 2014, quantos são os cargos de confiança nos mais altos setores do governo… Estes são só alguns dos casos que Castello Branco utilizou para demonstrar aonde estão e como é fácil acessar dados do poder público brasileiro.
“Sem o movimento essencial do repórter não é possível fazer nenhuma reportagem”. Essa foi a expressão destacada por Eliane Brum ao longo de toda a sua palestra. Movimento que, para ela, significa a sensibilidade do olhar, de ver o outro e de se colocar no mundo e na vida que o rodeia. A palestra da jornalista, escritora e documentarista dividiu-se em mais duas partes além do movimento essencial: os principais estereótipos ligados à cobertura sobre a Amazônia e a construção da memória oral em contraposição à escrita. “A nossa força como repórter é justamente a consciência pela fragilidade da nossa posição”, disse, destacando em sua fala, mansa e convicta, que é possível notar a paixão e o zelo pela reportagem, bem como sua sensibilidade ao captar as nuances dessa profissão tão singular e das histórias que testemunha. Durante cerca de duas horas, Brum indicou caminhos e possibilidades para todos aqueles que se propõem a reportar os fatos de uma outra forma. Como costuma fazer em suas palestras, Brum leu – ou melhor, recitou – para um auditório lotado ferramentas cruciais à prática do repórter, e ressaltou a responsabilidade diante das histórias que nos propomos a contar. O olhar humilde, mas longe de ser imparcial, seria uma das ferramentas para evitar o que ela chama de anti-jornalismo.