Miriam Leitão: “o jornalista precisa estar aberto a mudanças”

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Uma das mais importantes colunistas e comentaristas do país, Miriam Leitão admite: quer “morrer na reportagem”. Depois de dar uma palestra, responder a perguntas, conceder autógrafos e tirar fotos, Miriam Leitão conversou com a equipe de cobertura do Congresso da Abraji nas escadas de um dos prédios da PUC-Rio. Nesta entrevista, ela conta que a inspiração para a apuração de Paraíso Sitiado, reportagem sobre a qual palestrou, foram as grandes histórias que marcaram o jornalismo impresso. “Eu sou entendida, eu sou vista, como uma jornalista multimídia, mas um segredo aqui entre nós: eu amo o jornalismo impresso”, disse .

A sua perspectiva sobre os índios mudou depois que você fez a reportagem?

Mudou. Eu fiquei mais informada, mas fiquei sabendo que eu preciso estudar muito mais para entender a profundidade do tema. Eu nunca tinha ido a uma aldeia, me exposto a essa informação e fui justamente para uma aldeia que esta vivendo um momento bem inicial, nesse processo de contato. Aprendi, principalmente, sobre o que eu não sei.

E jornalisticamente, como você saiu de lá?

Jornalisticamente, eu enfrentei vários desafios. De repente, você sai com um monstro da fotografia. Aí, você pensa: “caramba, como é que eu vou fazer o texto? Como ele tem que ser?”. Eu optei por um texto bem narrativo, que levasse o leitor para dentro da história. Eu dei o lead na primeira página, mas fui narrando como a gente chegou, o que a gente sentiu. Eu fui deixando o texto ser escrito na sequência dos eventos, porque eu achei que eu deveria fazer um texto diferente.

Você acredita que os jornais tem que aproveitar essa chance que o on-line dá de expor áudio, texto e vídeo e fazer uma narrativa diferente para contar grandes histórias como essa?

Sim. Eu já produzi reportagens completamente multimídia. Quanto a essa, eu pensei: vou fazer uma história tradicional, do impresso. Lá, no meio da mata, eu vi que não dava, eu tinha que capturar alguma coisa para o on-line, ele  não poderia ser abandonado.

Você comentou que foi uma ousadia do jornal optar por dar destaque a reportagem.

Sim, você colocar uma feature na primeira página, que não é hard news, justamente nos dias em que os jornais mais disputam o leitor é uma ousadia. Eu fiquei muito feliz no dia seguinte, quando vários jornalistas no Twitter, de impresso, disseram que estão felizes porque aquilo era essencialmente jornalismo de imprensa escrita. Eu sou entendida, eu sou vista, como uma jornalista multimídia, mas um segredo aqui entre nós: eu amo o jornalismo impresso.

Você trabalha principalmente como colunista e comentarista. Você sente falta da grande reportagem, de ir para rua, de ser repórter?

Sinto falta. Ser repórter é difícil. É o mais difícil no jornalismo. Eu acho estranho que as pessoas envelhecem e querem sair da reportagem. Eu quero morrer na reportagem.

Então você vai fazer mais?

Eu vou. Certamente voltarei para a Amazônia. Os filhos também vão para lugares perigosos fazer reportagens. Eu, como mãe, fico com medo. Como jornalista, eu fico com orgulho.

Você acabou de lançar o livro “A perigosa vida dos passarinhos pequenos.” Vem mais por aí?

Tem mais coisas. Minha vida literária também está intensa. Eu tenho mais dois livros infantis já com a editora. Tem mais um que ainda não mandei para nenhuma editora, que escrevi outro dia a partir de uma conversa com a minha neta mais velha, que é uma musa inspiradora. Eu tenho um livro de ficção já entregue à Intrínseca, que será lançado em maio do ano que vem, chamado Tempos Extremos. Assim que eu terminei de escrever o Saga Brasileira, eu me senti livre para escrever ele. Eu tinha muita insegurança para escrever livros. Neste momento, eu estou escrevendo um de não ficção sobre o Brasil. Está exigindo tudo da minha massa encefálica para poder escrever. Eu tenho que entregar em junho do ano que vem. O Saga contou como a gente chegou até aqui. Esse vai falar sobre o futuro.

Como é a sua rotina? Como você toma a decisão do que falar na sua coluna diária?

Eu não tenho rotina. Vou trabalhando feito uma doida. Acordo de manhã e saio trabalhando, lendo muito, vendo muita coisa. A rotina é ir para o Bom Dia Brasil, faço o comentário, depois faço para o rádio e fico pesquisando  e  lendo para fazer a coluna.

O que é o jornalismo para você, e o que é ser jornalista?

O jornalismo é a arte de contar histórias. Entender algo e passar para pessoas que não estavam ali ou não sabem aquilo. Ele muda fortemente. Estamos todos, descobrindo, a cada momento, o que é ser jornalista e o que é o jornalismo.

O que o jovem jornalista precisa colocar em prática para ser um bom repórter e para chegar a um ponto em que será admirado pelo que produziu durante a vida?

Ele precisa saber que ele está em um momento em que tudo está mudando muito. Isso é muito assustador, mas é um privilégio. Se tudo estivesse estabelecido, como depois da revolução de Gutemberg… Mas não, o jornalismo está mudando. O jornalista precisa estar  aberto a mudanças, mas sem esquecer o essencial: ele é fundamental para a sociedade, ele é o meio da conversa, ele é “mídia”, e quanto maior for a qualidade da conversa, melhor democracia o Brasil vai ter.

Texto: Isabel Muniz e Victor Sena

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