Um novo ecossistema baseado em redes de cooperação

Debate sobre as redes de investigação a nível internacional (Foto: divulgação/Isabela Dias)
No último dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo (15/10), iniciativa conjunta da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Global Investigative Journalism Network (GIJN) e Instituto Prensa y Sociedad (IPYS), a tônica foi a criação de redes de colaboração internacional entre jornalistas. Mediada por David Kaplan, diretor do GIJN e profissional premiado quatro vezes com o prêmio do Investigative Reporters and Editors (IRE), a mesa “Redes de investigação: melhores práticas” teve ainda a participação de Carlos Eduardo Huertas, diretor da plataforma Connectas; Brigitte Alfter, diretora do European Fund for Investigative Journalism; Khadija Sharife, do Forum for African Investigative Reporters e Carlos Dada, do El Faro. Os impactos do processo de globalização na criação de uma sociedade “internacionalizada” e cada vez mais complexa serviram de plano de fundo para o debate acerca das possibilidades e limitações da realização do jornalismo investigativo em um momento de crise da imprensa tradicional. “No futuro, trabalharemos com o jornalismo cross-border como um método, mas que deve ser aplicado em histórias realmente relevantes, pois demanda tempo, preparação e dinheiro”, acredita Brigitte Alfter. Brigitte Alfter, do European Fund for Investigative Journalism (Foto: divulgação/Isabela Dias)
Para Khadija Sharife, esse tipo de jornalismo representa não apenas um meio de construir networking, mas configura também um sistema de conhecimento que pode contribuir para a dissolução de ideias cristalizadas.

Pensar a narrativa em diferentes formatos é dever do jornalista

As novas tecnologias mudaram a concepção do fazer jornalístico. Para atrair o público não basta contar uma boa história. Pensar a narrativa em diferentes ângulos também é dever do jornalista que, agora mais do que nunca, deve atuar em equipe com desenvolvedores e designers. Amanda Cox – The New York Times (Foto: Rodrigo Gomes/Abraji)
Essa foi a mensagem que Amanda Cox, editora de visualização do The New York Times, e Mariana Santos, designer de narrativas visuais interativas do La Nación, da Costa Rica, deixaram para os participantes da palestra “Narrativas Multimídia”, realizada nessa terça (15), último dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, no Rio de Janeiro. Para Amanda, “a narrativa multimídia é capaz de levar os leitores para lugares que provavelmente nunca poderiam ir”, permitindo um envolvimento completo com o conteúdo.

Reportagens investigativas recebem prêmios no Theatro Municipal

Não apenas de palestras, cursos e workshops foi feita a 8° Conferência Global de Jornalismo Investigativo. Também houve o momento onde os memoráveis trabalhos de investigação tiveram o devido reconhecimento. O local escolhido para abrigar, na noite desta segunda (14), a coroação das reportagens, foi o  Theatro Municipal do Rio de Janeiro. A noite iniciou em grande estilo com a homenagem prestada pela Abraji ao jornalista Marco Sá Correa. O autor da reportagem premiada com menção honrosa do Esso em 1977, sobre os detalhes da Operação Brother Sam, foi prestigiado com um vídeo que contou com o depoimento de doze colegas de profissão, dando-nos a dimensão da importância deste jornalista na história da comunicação.

Cobertura internacional deve ir além das agências de notícias, afirma Cláudia Antunes

 
Coordenador de Comunicação da PUC-Rio, Leonel Aguiar, e a jornalista Claudia Antunes
Com todos os lugares do auditório ocupados, a editora da revista Piauí Claudia Antunes discutiu como a editoria internacional no Brasil é pautada pelas manchetes dos grandes jornais estrangeiros. Seria culpa da facilidade de acesso a informações de agências de notícias ou da falta de concorrência devido à grande concentração midiática e à prevalência de um viés ideológico? Durante a mesa “Cobertura Internacional no Brasil: hora de construir uma agenda própria?”, a jornalista analisou os fatores que influem nesta editoria, na qual possui uma experiência de mais de 20 anos. As informações de agências de notícias são amplamente utilizadas por jornais, elas possuem “braços” espalhados por vários lugares do mundo, diferentemente dos semanários nacionais. Contudo, Claudia não considera que esta deva ser a fonte primordial da cobertura internacional.

Miriam Leitão diz ter sentido medo ao fazer reportagem sobre índios Awá

A jornalista Miriam Leitão conta suas histórias pela Floresta Amazônica
Jornalista há 40 anos, Miriam Leitão admite: “com tantos anos de carreira, as pessoas pensam se é possível uma jornalista experiente poder sentir medo ao fazer uma reportagem? Sim, e que bom, eu ainda tenho medo!”. Assim, a jornalista descreveu o que sentiu ao viajar para a aldeia Juruti, a convite do fotógrafo Sebastião Salgado e contar a história dos Awá em Paraíso sitiado – a luta dos índios invisíveis, publicada pelo O Globo em agosto desde ano. Com Gazeta Mercantil, Jornal do Brasil, Veja e O Estado de S. Paulo no currículo, Míriam é atualmente colunista na CBN, no jornal O Globo, comentarista no matutino Bom Dia Brasil (TV Globo) e apresentadora de um programa próprio na Globo News. Miriam contou ao público, que assistia com atenção a seu depoimento, como a reportagem com os Awá a tirou da zona de conforto ao mudar completamente seus personagens.

Jornalistas lideram em solicitações à Lei de Acesso, aponta CGU

Jorge Hage Sobrinho apresenta o balanço do governo federal sobre a Lei de Acesso à Informação. Foto: Louise Rodrigues
Das 124.394 solicitações realizadas em 18 meses de Lei de Acesso à Informação (LAI), 5,15% são de jornalistas, que lideram o perfil de solicitantes, segundo Jorge Hage, chefe da Controladoria Geral da União (CGU). A porcentagem equivale a 6.187 pedidos feitos por profissionais da comunicação, resultando numa média de 343,7 demandas mensais à LAI. Os dados foram apresentados no painel “Lei de Acesso à Informação: balanço de 18 meses”, realizado, nesta segunda (14), na PUC-Rio. A conferência fez parte da programação da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, que acaba terça (15). Em comparação aos demais solicitantes, os jornalistas também são os que mais recorrem: uma média de 6,5%. Dos mais de 6 mil pedidos feitos pela categoria, 88% tiveram acesso concedido, 9% negado e 3% duplicados, informações inexistentes ou de competências de outros órgãos.

Como investigar fraudes nas áreas da saúde e da indústria farmacêutica

Ranbaxy:  medicamento para aidéticos adulterado
Ao longo de quatro anos, Katherine Eban, repórter da revista americana Fortune, investigou a adulteração dos remédios genéricos produzidos e prescritos não apenas nos Estados Unidos, mas também em diversos outros países como Brasil, Índia e Rússia. A extensa apuração da denúncia, feita por emails anônimos, levou à confirmação do que muitos já suspeitavam: no mundo todo, pacientes de doenças graves como câncer e Aids estavam sendo enganados por substâncias que não faziam o efeito que deveriam fazer. E pior: as agências de regulação dos países investigados não realizavam o controle da produção e da eficácia dos medicamentos como deveriam fiscalizar. A reportagem “Dirty Medicine” foi uma das apresentadas na mesa “Investigando pautas em saúde”, realizada nesta segunda (14), no terceiro dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, na PUC-Rio, que também contou com a participação do jornalista venezuelano David González, do El Nacional e da nigeriana Rose Nwaebuni, do Pointer Newspaper. Segundo os jornalistas, para investigar denúncias na área de saúde é preciso persistência e preparo.

O acesso à informação como ferramenta

“O direito de saber é, antes de tudo, um direito humano”, ressalta Marina Atoji, gerente-executiva e redatora da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas. Marina esteve ao lado de Claudia Collucci, jornalista especializada em saúde da Folha de S.Paulo, para apresentar a mesa “o direito de acesso a informações privadas de interesse público”, realizada no domingo (13), segundo dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, que acontece na PUC-Rio até terça (15). O mediador Marcelo Beraba, diretor da sucursal do jornal O Estado de S.Paulo no Rio de Janeiro e diretor da Abraji,  explicou a importância desse novo debate após a criação da Lei de Acesso à Informação do Brasil (LAI). Mesa debateu o acesso à informação (Foto: Rodrigo Gomes/Abraji)
“Desde o início da Abraji, uma das nossas bases de trabalho é o direito de acesso à informação pública. Demos o primeiro passo e agora temos uma Lei que nos respalda para pedir essas informações.

Caco Barcellos e José Hamilton: duas gerações e uma só paixão

Ninguém queria perder a oportunidade de assistir a um dos encontros mais marcantes  do primeiro dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, que acontece na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ) até terça-feira (15). Caco Barcellos, repórter e editor do “Profissão Repórter”, da TV Globo, e José Hamilton Ribeiro, responsável pela direção do tradicional “Globo Rural”, da mesma emissora, estiveram juntos, neste sábado (12), para compartilharem suas experiências e sua paixão em comum pelo jornalismo. O encontro entre as duas gerações da boa reportagem, oportunamente intitulado “Profissão: repórteres”, fez o número de público superar a capacidade do auditório. Aos que ficaram de fora, restou exigir a abertura das portas. Por fim, a palestra foi repetida.

Para diretor da IRE, jornalismo de dados é possível mesmo em países pouco transparentes

A transparência de governos e empresas desempenha papel importante para as investigações jornalísticas, mas, para Mark Horvit, diretor-executivo da Repórteres e Editores Investigativos (IRE, na sigla em inglês), “sempre é possível fazer jornalismo de dados, independente de onde você estiver”. Professor associado da Escola de Jornalismo da Universidade de Missouri, nos Estados Unidos, Horvit ministrou um workshop sobre uso de banco de dados para iniciantes, na Conferência Global de Jornalismo Investigativo. Segundo o jornalista, ótimos dados têm vindo de países onde o governo não colabora com a divulgação de números. “Em alguns países há a quantidade mínima (de informação), e em alguns lugares o governo não dá dado algum. Você encara matérias diferentes e, também, maneiras diferentes de conseguir o conteúdo”, destaca Horvit, especialista em Reportagem Assistida por Computador (RAC) e participante de programas como o Instituto Nacional de Reportagem Assistida por Computador (Nicar, na sigla em inglês).