Investigações sobre arquivos ocultos da ditadura

Trazer a público documentos que estão fora do alcance da população é o objetivo de Matheus Leitão e Rubens Valente, da Folha de S.Paulo, quando publicam reportagens investigativas sobre a história brasileira. Na mesa “Arquivos ocultos da ditadura”, eles explicaram o processo de investigação destas reportagens. Há cerca de dois anos, eles iniciaram um projeto que se desenvolveu em três frentes. A primeira foi maior divulgação em massa dos telegramas produzidos pelo Ministério das Relações Exteriores. Depois, os repórteres se engajaram na leitura de 250 processos para entender como funciona a impunidade no Brasil.

A voz dos sobreviventes do ‘holocausto brasileiro’

No domingo (13) à tarde, uma fila se estendia pelo pilotis da PUC-Rio. O motivo era a sessão de autógrafos do livro da jornalista mineira Daniela Arbex, “O Holocausto Brasileiro”, em meio à Conferência Global de Jornalismo Investigativo. Na obra, a autora resgatou os horrores do Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais, responsável pela morte de mais de 60 mil pessoas. Sessão de autógrafos com Daniela Arbex (Foto: Guilherme Ramalho)
Inaugurado em 1903, o maior hospício do Brasil recebia, em condições desumanas, pessoas sem sintomas de loucura ou insanidade. Repórter do jornal Tribuna de Minas, Daniela descobriu o caso em 2009, folheando um livro que continha parte de fotos do interior do hospício feitas pelo fotógrafo Luiz Alfredo, da revista “O Cruzeiro”, em 1961.

Sensibilidade é fundamental na cobertura de tragédias, defende jornalistas

“A técnica que você usa para entrevistar um político ou um empresário não funciona para entrevistar vítimas de tragédias”, explica Shapiro. (Foto: Giulia Afiune)
Carlos Alexandre, filho de militantes de esquerda, foi torturado ainda bebê durante a ditadura militar.  Com dificuldades para viver em sociedade, foi diagnosticado com fobia social e morreu este ano. “Pensei que seria interessante investigar essa história porque não são comuns casos de crianças que sofreram tortura durante a ditadura”, revela a jornalista Solange Azevedo, autora da reportagem “A ditadura não acabou”, publicada na revista IstoÉ, em janeiro de 2010. Solange participou da palestra “cobertura de desastres e traumas – como fazer investigações com sensibilidade”, realizada domingo (13), na Conferência Global de Jornalismo Investigativo, que acontece na PUC-Rio até terça (15).

Rostos invisíveis: De frente com as faces ocultas do jornalismo

Três grandes nomes estiveram presentes na palestra sobre Reportagem com Câmera Escondida no segundo dia da Conferência Global de Jornalismo Investigativo 2013, um deles foi Eduardo Faustini, jornalista da TV Globo. André Luiz Azevedo, também da TV Globo e Fernando Molica, ex-diretor da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e editor no jornal O Dia, também participaram da mesa. Conhecer o rosto de Eduardo Faustini foi privilégio dos cerca de 150 participantes presentes, já que não foi permitido filmar ou fotografar o especialista em câmera escondida.“Eu consigo fazer meu trabalho por causa desta ocultação”, explicou o repórter. Enquanto Eduardo Faustini mantem sua identidade resguardada, André Luiz Azevedo é muitas vezes o rosto de suas reportagens. “O Faustini me botou na cara do gol e eu tive o privilégio de não chutar pra fora” elogiou o colega de trabalho. Durante a palestra, foram citados exemplos de matérias feitas com câmera escondida. Foi exibida uma reportagem sobre denúncias de abuso sexual de um médico ortopedista que atendia pacientes em um Posto de Atendimento Médico (PAM), da Zona Norte do Rio de Janeiro. Na opinião de Faustini, a repórter encarregada de flagrar as atitudes indevidas do médico conseguiu o melhor enquadramento da câmera escondida até hoje.

Cobertura ambiental e investigação

O troféu do veterano jornalista Mark Shapiro, há duas décadas na cobertura de meio ambiente, é uma pedra do tamanho de um punho suja de petróleo. Na palestra Vanguarda da Reportagem Ambiental, na 8ª Conferência Global de Jornalismo Investigativo, Shapiro contou a história de como ela foi em suas mãos. Tudo começa numa manhã de 2002, quando o jornalista americano lia uma reportagem do New York Times sobre o petroleiro Prestige, que havia naufragado na costa da Espanha e provocara um dos maiores desastres ambientais de derramamento de óleo da história europeia. A primeira pergunta que lhe veio a cabeça foi: “por que esse navio está registrado nas Bahamas, se os proprietários são da Grécia?”. O questionamento levou Shapiro à paradisíaca praia da Galícia, no norte da Espanha, cenário do desastre e local onde encontrou a tal pedra que hoje enfeita sua mesa de trabalho. E, dali, foi em busca do responsável pelo crime ambiental.

“Dar voz aos esquecidos é dever do jornalismo investigativo”, defende Cabrini

Uma reportagem só vale a pena se mudar a vida das pessoas. Essa é a convicção de Roberto Cabrini, um dos jornalistas investigativos mais premiados do Brasil, sobre a função social da imprensa. Na palestra “A Casa dos esquecidos: insanidade, abandono e violência” neste sábado (12), na Conferência Global de Jornalismo Investigativo, Cabrini defendeu que todo jornalismo deve ser investigativo, embora reconheça que as redações atuais sejam guiadas pelo automatismo e pela falta de apuração. No comando do “Conexão Repórter”, do SBT, Cabrini cita princípios fundamentais do jornalismo. (Foto: Lucas Torres)
“Muitos repórteres saem da redação com uma convicção e querem editar o conteúdo de acordo com o que é conveniente a ele ou à empresa para que trabalhe.

Investigação e uso de dados abertos

“Vamos fazer magia”. Assim  Giannina Segnini começou sua palestra na tarde de sábado (13) sobre a investigação do crime organizado através do uso de dados disponíveis na internet. O uso de sites de busca específicos para investigação de tráfico de drogas e armas foi o principal foco da mesa de Giannina. A investigação intermediada por sites de busca e pesquisa avançada, porém, pode apresentar riscos para os jornalistas. A apuração em reportagens investigativas é, como se sabe, fator essencial para fugir da divulgação de informações falsas ou manipuladas pelo poder público.

Arquivos ajudam a revelar histórias esquecidas

Ocultas em arquivos, histórias reveladoras podem estar esquecidas, à espera de alguém que as descubra. Esta é a lição da mesa Investigações Históricas, que contou com a presença dos jornalistas José Raul Olmos, do mexicano Diario AM;  Germán Jiménez, do portal El Colombiano; e Ewald Scharfenberg, correspondente do jornal El País na Venezuela, com a mediação de Luis Jaime Cisneros, diretor do Ipys. Luis Cisneros, Raul Olmos, Germán Jiménez e Ewald Scharfenberg
Impulsionados pela História, a paixão pela profissão e a vontade de desmascarar fatos ocultos, Scharfenberg, Jiménez e Olmos foram fundo na investigação em arquivos históricos para descobrir mensagens, cartas e ofícios que ajudaram a reconstruir capítulos desconhecidos do exercício do poder. A prática fundamental para o jornalismo investigativo, contudo ainda pouco explorada, na visão de Olmos. “Para isto é necessário paciência, perseverança, olhar crítico e capacidade de atar fios para encadear histórias atrativas”, explicou Olmos.

“É preciso errar muito para encontrar o modelo de negócio sustentável”

Foto: Victor Sena
O modelo de negócio mais adequado para uma organização de jornalismo investigativo depende de suas características e objetivos. Para Reg Chua, editor de dados e inovação na Thomson Reuters, Sheila Coronel, do  Centro Filipino de Jornalismo Investigativo (PCIJ) e Charles Lewis, diretor do Investigative Reporting Workshop, da American University School of Communication, neste ramo ainda não existe uma fórmula ideal para financiar projetos sem fins lucrativos. Os jornalistas estiveram juntos, neste sábado (12), na mesa “O Jornalismo Investigativo como Negócio: Que Modelos Funcionam?”, mediada por Kevin Davis, diretor-executivo da Investigative News Network (INN), que integra a programação da Conferência Global de Jornalismo Investigativo, realizada na PUCRJ até terça (15). Os três concordam que as novas organizações precisam experimentar diferentes meios de financiamento até encontrar as formas mais apropriadas ao seu projeto. Para captar recursos, ressaltam, é fundamental definir o tipo de conteúdo jornalístico que se pretende produzir e deixar claro para o público quem financia as investigações.

‘Copa do Mundo de jornalismo investigativo’ começa com mais de mil inscritos

David Kaplan saúda jornalistas na aberta da Conferência Global de Jornalismo Investigativo
Mais de mil jornalistas de cerca de 80 diferentes países já estão reunidos na PUC do Rio de Janeiro para a Conferência Global de Jornalismo Investigativo. O evento, apelidado pelo professor da Universidade do Texas Rosental Calmon Alves de ‘Copa do Mundo do Jornalismo Investigativo’, já pode ser considerado o maior realizado sobre o tema até hoje, segundo o diretor da Global Investigative Journalism Network (GIJN), David Kaplan. Serão cerca de 140 painéis e workshops, 240 palestrantes e mais de 200 horas de atividades, muitas das quais simultâneas. O painel de abertura foi apresentado por um dos fundadores da Abraji, o jornalista Fernando Rodrigues, e contou com a participação dos diretores das organizações anfitriãs, Marcelo Moreira, da Abraji, David Kaplan, da GIJN e Augusto Alvarez Rodrich, presidente do Instituto Prensa y Sociedad (IPYS). “Muitos de vocês vieram de lugares distantes, África do Sul, China, Irlanda, Nova Zelândia.